Woody Allen é fã
assumido de Ingmar Bergman. Quem conhece superficialmente os dois pode ficar
surpreendido. O primeiro é notório por suas comédias e neuroses e o segundo por
seus filmes dramáticos e existencialistas.
Um ponto de convergência entre os dois cineastas é o filme “A Outra” (Another
Woman, EUA, 1988) dirigido por Allen, que tem o roteiro inspirado na obra de
Bergman “Morangos Silvestres” (Smultronstället, Suécia, 1957).
O longa-metragem
sueco acompanha um renomado, metódico e egocêntrico professor de medicina que
irá receber uma homenagem. O médico faz uma viagem acompanhado de sua nora e
mais três caroneiros. Durante o trajeto o doutor passa por lugares de sua
infância onde se lembra de uma antiga namorada, têm sonhos que revelam como ele
foi mesquinho e frio “parece que quero me dizer algo que não quero ouvir
acordado” diz o médico. O personagem principal do filme tem idade avançada e
por isso receia a morte, percebe que sua solidão é o resultado de seu
individualismo. A nora o faz perceber sua insensibilidade e falta de trato que
teve com seus parentes.
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| Cartazes de "A Outra" e "Morangos Silvestres" |
A película faz uma
incursão profunda e reflexiva sobre a vida. Para o expectador, dependendo da
idade, pode ponderar-se da seguinte maneira. Uma pessoa mais velha faz uma
retrospectiva de sua vida e pensa se tudo o que fez e sentiu valeu à pena. Já
um jovem pode pensar melhor as atitudes futuras.
Se “Morangos
Silvestres” é visto como uma obra prima, “A Outra” é visto pela critica como um
filme secundário na carreira de Allen e como uma parodia de Ingmar Bergman. O
diretor nova-iorquino vinha das bens sucedidas comédias “A Rosa Púrpura do
Cairo” e “Hannah e Suas Irmãs”, mas deixou de lado o humor e investiu no drama.
O público sentiu-se abandonado.
Mas “A Outra” surpreende,
e seu argumento não fica preso na inspiração, ao contrário, expande-se. A
película segue a vida da professora universitária Marion Prost, ela é muito
organizada e pensa que tem sua vida sobre controle. Para escrever um livro e
fugir do barulho a protagonista aluga um apartamento que fica ao lado de um
consultório de psicanálise. Através do sistema de ar ela consegue ouvir os
relatos dos pacientes, em especial de uma mulher grávida que está em crise no
casamento.
Se em “Morangos
Silvestres” a percepção da personalidade é de modo onírico, em “A Outra” são as
confissões tristes e melancólicas de uma jovem que fazem a protagonista
perceber que sua vida, apesar de estável e confortável, foi desprovida de
sentimentos. (Há apenas um sonho revelador). Ela começa a questionar e repensar
seu passado “E me pus a pensar se uma recordação seria algo que se tem ou se
perdeu” reflete Marion.
O ponto chave dos
dois filmes é a avaliação da vida. Em um é o senhor já no final de sua existência,
em outro é de uma mulher madura que enfrenta a crise de cinquenta anos. Os
diretores conduzem os filmes de maneira em que os personagem analisam e contemplam suas trajetórias. Através da introspecção julgam se valeu toda a
confiança e egoísmo em si mesmos, não de maneira hermética e difícil, nem com lições de
moral. Ambas as histórias são muito bem narradas. “Morangos Silvestres” é
um marco cinematográfico, e “A Outra” não nega a influência e se equipara a sua
inspiração.
Repórter William
Kelba
Editora Bianca
Portela

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