Assistimos, nestes últimos dias, a mais uma daquelas notas que deveriam
entrar nos anais da história da política brasileira. Mas, por nossa curta
memória, logo será esquecida.
O apoio do PP ao PT na disputa à prefeitura de São Paulo não deveria
causar muita estranheza; o partido capitaneado por Paulo Maluf já faz parte da
base de partidos do governo federal. Neste ponto, não fosse a política
brasileira o que é, residiria a primeira contradição. O PP é cria direta do
antigo PDS( Partido Democrático Social) o representante mais fiel às teses
direitistas surgido do fim do sistema bipartidário, no início dos anos 1980. O
(e)leitor mais atento poderia perguntar qual seria o motivo de um partido com
ideias e planos de governo claramente voltados à direita fazer parte da base de
um governo nascido, criado e representado pela esquerda.
Mas, como disse antes, a política brasileira é o que é. E mais um
capítulo desta história cômico-trágica aconteceu esta semana. Ao decidir apoiar
o candidato indicado pelo ex-presidente Lula à prefeitura de São Paulo, o
ex-ministro da educação Fernando Haddad, Paulo Maluf exigiu um preço alto pelo
seu pouco mais de 1 minuto de televisão: que Lula fosse, pessoalmente, à casa
de Maluf e, sorridente, posasse para fotos ao lado daquele que, não há muito
tempo, chamava “ave de rapina”. Desta forma, deu o tiro de misericórdia naquilo
que ainda se imaginava que poderia restar: dignidade política. As alegadas
convicções petistas e a ética que supostamente os diferenciava dos demais tinha
sido jogada no lixo. Em nome de um projeto de poder.
Logo ele, Paulo Maluf. Uma das lendas vivas da política brasileira;
talvez o símbolo maior da nossa incapacidade de transformar em castigo político
o que já foi devidamente julgado pela justiça (no caso dele, internacional).
Mas não estranhemos. Lula, em nome da “governabilidade”
que assola o país, já se uniu a outros outrora inimigos, que desde sua passagem
pelo poder são da base governista: para ficarmos nos exemplos mais notórios,
quem não lembra dos embates de Lula com Fernando Collor, José Sarney e Jader
Barbalho?
Apostam eles em nossa curtíssima memória, especialmente no que se refere
aos movimentos de nossa classe política. Pelo menos não há de se ter mais
sombra de dúvida: a política brasileira não se faz com base em ideais; em
projetos de governo; em convicções próprias. Ela é baseada exclusivamente em um
projeto de poder; e, para atingi-lo, qualquer pecado é perdoado. Não há preço
alto a ser pago por segundos de TV; não há história pessoal que não se possa
jogar no lixo.
Luís Carlos Prestes, ícone comunista brasileiro, apoiou a candidatura de
Getúlio Vargas à presidência da República em 1950. Poucos anos antes, Getúlio
tinha enviado a esposa de Prestes, a judia alemã Olga Benário, grávida, para a
Alemanha nazista, onde morreria em um campo de extermínio. Prestes justificou
assim o apoio ao seu inimigo, para estupefação de amigos e inimigos: “meus
dramas pessoais não podem ficar acima dos interesses do partido. Aceito apoiá-lo”.
Lula aprendeu muito com Prestes.
repórter Bianca Portela
editor William Kelba
Nenhum comentário:
Postar um comentário